O Brasil é uma potência da biodiversidade. Com seus vastos biomas – Amazônia, Cerrado, Mata Atlântica e Pantanal – o país abriga uma das maiores riquezas naturais do planeta, servindo de lar para milhares de espécies que não existem em nenhum outro lugar do mundo. Mas essa riqueza, que deveria ser motivo de orgulho e preservação, também insere o país no centro de uma crise ambiental silenciosa e devastadora: o tráfico de animais silvestres.

Entre 2015 e 2021, o tráfico de fauna e flora silvestre movimentou números alarmantes: cerca de 13 milhões de espécimes apreendidos globalmente, somando um peso total de 17 mil toneladas. Desse montante praticamente inimaginável, uma parte significativa tem origem no Brasil, que se destaca tanto como fonte quanto como rota de trânsito para o comércio ilegal de vida selvagem. E os números de diversos estudos publicados quase que anualmente pela comunidade especializada não mentem: espécies icônicas como papagaios, araras, tartarugas e jacarés brasileiros figuram no topo das listas de animais visados para mercados que vão de colecionadores europeus a consumidores asiáticos.

Aves e répteis são as maiores vítimas em quantidade

As aves, em especial as araras e os papagaios, tão típicos dos nossos biomas tropicais são muitas das vezes as maiores vítimas desse comércio criminoso. O papagaio-verdadeiro (Amazona aestiva), conhecido por sua plumagem vibrante e capacidade de imitar sons humanos, é um dos principais alvos. Capturados ainda filhotes, muitas vezes retirados brutalmente de seus ninhos, essas aves de porte médio enfrentam condições desumanas de transporte para atender à demanda internacional. Araras-azuis e araras-vermelhas, símbolos da exuberância natural do Brasil, são traficadas para colecionadores que pagam verdadeiras fortunas para tê-las em gaiolas de luxo.
Os répteis também não escapam. O jabuti-piranga (Chelonoidis carbonarius) é amplamente contrabandeado para o mercado de pets exóticos, enquanto jacarés são abatidos para o comércio de peles, transformadas em bolsas e acessórios de luxo que enfeitam vitrines internacionais.

País também é rota do comércio selvagem

O Brasil não é apenas um exportador de fauna. Sua geografia estratégica, com uma vasta extensão territorial e fronteiras compartilhadas com diversos países sul-americanos, torna o país uma rota de trânsito vital para o tráfico internacional. Portos e aeroportos brasileiros são usados como pontos de saída para mercados na Europa, América do Norte e Ásia. Traficantes aproveitam-se de brechas na fiscalização, corrupção e rotas terrestres isoladas para movimentar milhares de animais anualmente.

Entre 2015 e 2021, 9% das apreensões globais de tipos de crocodilos e 4% das apreensões de tartarugas foram relacionadas ao comércio ilegal de espécies brasileiras. Esses números ilustram a magnitude do problema e como o Brasil se posiciona como um dos principais protagonistas dessa tragédia ambiental.

Impactos devastadores na biodiversidade

Os impactos do tráfico de fauna vão muito além dos números. Espécies como a arara-azul e o tatu-bola, já ameaçadas de extinção, enfrentam declínios populacionais críticos. Cada animal retirado de seu habitat é mais do que um número: é uma peça perdida em um ecossistema complexo e interdependente. Quando um predador ou polinizador desaparece, o equilíbrio ecológico é desfeito, com consequências que afetam desde a regeneração florestal até a segurança alimentar de comunidades locais.

O tráfico também tem um custo humano. Ele mina o sustento de populações que dependem do ecoturismo e de práticas sustentáveis para sobreviver. Além disso, a exploração ilegal de recursos naturais está frequentemente ligada a redes de corrupção e crime organizado, que enfraquecem a governança ambiental e a aplicação da lei.

Brasil no centro do combate

Apesar dos esforços internacionais, como a CITES (Convenção sobre o Comércio Internacional de Espécies Ameaçadas), o Brasil enfrenta desafios monumentais para conter o tráfico de fauna. Corrupção, falta de fiscalização eficiente e ausência de tecnologias avançadas para monitorar rotas ilegais são barreiras que permitem que esse comércio persista.

No entanto, há esperança. O fortalecimento das redes de fiscalização e o engajamento da sociedade civil são passos essenciais para reverter esse cenário. É crucial que o Brasil não seja apenas uma potência da biodiversidade, mas também um exemplo global de preservação e combate ao tráfico de vida selvagem.

Chamado à população

A pergunta que fica é: qual será nosso papel enquanto brasileiros no futuro da vida silvestre global? Será que seremos lembrados como guardiões da biodiversidade ou como cúmplices de sua destruição? A resposta está nas nossas mãos e nas dos governos que elegemos. Porque, como diz o velho ditado, “com grande poder vem grande responsabilidade” – e o Brasil tem um poder imensurável nas mãos. O momento de agir é agora.

Junte-se a nós e apoie a causa silvestre. Não compre animais silvestres, colabore com as instituições de proteção.

Fonte: Relatório Mundial sobre Crimes contra a Vida Silvestre 2024, UNODC.